Sentença sobre Ação Declaratória de Inexistência de Débito.
O sentença abaixo foi conquistada na Comarca de Chapecó e trata de uma ação movida por pessoa física contra pessoa jurídica, alegando que um cheque sem fundos, inscrito no SPC em nome do Autor era falso, pois o Autor teve a anos atrás seus documentos furtados.
É muito importante que empresas prestem muita atenção à este "golpe" que vem aumentando cada vez mais.
Pessoas se afundam em dívidas e ao perceberem que não irão conseguir quitar todos os débitos, surgem com um Boletim de Ocorrência alegando que teve seus documentos furtados e que tal dívida não foi por si contraída.
Ocorre que, se esta pessoa tem apenas uma inscrição no SPC ou SERASA aí sim configura a inexistência do débito por ter tido seus documentos furtados, porém se provado que tal pessoa tem muitas dívidas inclusive dívidas contraídas anteriormente ao furto dos documentos, está devidamente configurada a fraude para que o mesmo se exima de pagar suas dívidas e ainda tenta buscar o enriquecimento ilícito através de um pedido de indenização por dano moral.
Ressalto que a sentença abaixo foi proferida pelo Juiz de primeiro grau e agora está em fase de apelação.
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Autos n° 018.10.004214-4
Ação: Declaratória/Ordinário
Requerente: Albino Mazzo
Requerido: Auto Posto Madalena II
S E N T E N Ç A
1 – Relatório:
Albino Mazzo ingressou com ação declaratória de inexistência de débito c/c indenizatória em face de Auto Posto Madalena II (Irmãos Schoepping Ltda).
Na inicial, o autor relata que foi surpreendido com a existência de uma anotação junto ao rol de inadimplentes feita pela ré, em 17.07.2006, e originada de dívida vencida em 12.07.2005. Contudo, alega que não realizou qualquer transação com a empresa ré e que, há aproximadamente 04 (quatro) anos, perdeu seus documentos, dos quais terceiro de má-fé vem fazendo uso para contrair dívidas em seu nome. Disse que a transação que culminou na negativação ocorreu por culpa da ré, por não ter tomado as cautelas necessárias para verificar que se tratava de um falsário. Menciona que ficou moralmente abalado, tendo sofrido vexame e humilhação no comércio local.
Requer que a dívida causadora da inscrição seja declarada inexistente e a ré condenada ao pagamento de indenização por danos morais, a ser fixada em 30 (trinta) salários mínimos, bem como de despesas processuais e honorários advocatícios.
Juntou os documentos de fls. 08/15.
Deferiu-se a gratuidade da justiça (fl. 17).
Citada (fl. 17-v.), a ré apresentou resposta, na modalidade de contestação (fls. 18/25).
Em preliminar, alega sua ilegitimidade passiva ad causam, pois entende que ação deveria ter sido proposta em face do Banco Itaú. Suscita a prejudicial de mérito consistente na prescrição da pretensão do autor. No mérito, alude que a conta corrente a qual está vinculado o cheque que gerou a inscrição foi aberta antes (maio de 2005) de o autor perder seus documentos (2006). Assevera que o cheque foi emitido pelo autor e que, antes mesmo de providenciar a inserção do seu nome no rol de maus pagadores, tal providência já havia sido realizada por outros credores, inexistindo, assim, dano moral.
Pede o acolhimento da preliminar ou, alternativamente, a improcedência do pedido e a condenação do autor por ter litigado de má-fé.
Amealhou aos autos os documentos de fls. 20/35.
Houve réplica (fls. 38/41).
A parte ré requereu o depoimento pessoal do autor (fl. 46).
Designou-se audiência (fl. 47).
Nova petição da ré, pleiteando apresentar as perguntas ao autor por escrito (fl. 52).
Indeferiu-se tal providência (fl. 55).
Manifestou-se o autor às fl. 57.
Às fls. 59/60, juntou-se documento novo.
Aberta a audiência, a ré não se fez presente, culminando na desistência da prova e no encerramento da fase de instrução (fl. 61).
Vieram-me os autos conclusos.
2 – Fundamentação:
Trata-se de ação declaratória e indenizatória, pela qual visa a autora a declaração de inexistência de débito e ressarcimento de danos morais, ocasionados pelo lançamento de seu nome junto aos órgãos creditícios em face de dívida inexistente .
Repisa-se que a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam guarda relação com o mérito (nexo causal).
A suscitada prescrição alusiva à pretensão de ressarcimento não prevalece.
In casu, tratando-se de demanda onde se perquire apurar responsabilidade civil e a respectiva condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais, o prazo prescricional é trienal.
Não é outro o preceito insculpido no artigo 206, § 3º, V, da Lei Civil, in verbis:
"Art. 206. Prescreve:
[...] § 3o Em três anos:
[...] V - a pretensão de reparação civil;"
Ao reverso do vetusto Código Civil, que não guardava dispostivo regulando a prescrição da pretensão de reparação civil e que o prazo era o geral (20 anos), o novel prevê regra específica acerca do tema (03 anos – art. 206, §3º, V).
A propósito, Arnaldo Rizzardo (Parte Geral do Código Civil. 6 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2008, p. 660) preleciona que: "Pelo vigente estatuto, todas as ações indenizatórias que visam a reparação de qualquer dano têm o prazo limitado em três anos para ajuizamento." (grifei)
Não obstante tais inferências, tem-se que o termo inicial da contagem da prescrição é a data da violação do direito, momento este em que surge a respectiva pretensão ao seu titular. E em se tratando de inscrição indevida nos órgãos de proteção ao crédito, a lesão ao direito perdura até que seja efetivamente levantada.
No caso em testilha, a anotação em face do autor ainda existe, sendo descabido falar de prescrição de eventual pretensão de reparação civil.
Entrementes, os pedidos de declaração de inexistência de débito e de indenização por danos morais não merecem acolhida.
O registro do nome do autor no banco de dados de inadimplentes ocorreu em 17.07.2006, tendo como base o cheque n. 1860496, de acordo com o que se extrai dos documentos de fls. 13 e 33.
Ocorre que está estreme de qualquer dúvida que foi o autor quem emitiu o título de crédito, e não terceiro de má-fé, consoante relatado na peça exordial. Tal conclusão reluz cristalina após cotejar as informações insertas nos documentos de fl. 13, 33 e do termo de audiência de fl. 60.
Verifica-se que o cheque que originou o débito foi emitido em 12.07.2005 e pós-datado para o dia 12.08.2005, tendo sido nominado em favor da empresa ré. Após ter sido apresentado por duas vezes (em 15.08.2005 e 22.08.2005) junto ao banco sacado e devolvido em razão da inexistência de provimento de fundos (fl. 33), acarretou a negativação ora discutida.
Todavia, o autor extraviou seus documentos após a emissão da susomencionada cártula. Na inicial, disse que tal fato ocorreu, aproximadamente, no ano de 2006 (quatro anos antes da propositura). Mais tarde, porém, o documento amealhado à fl. 59 comprova que o boletim de ocorrência relacionado a esse evento foi registrado em 08.11.2005. Logo, resta patente a inverossimilhança de suas alegações.
Não bastasse isso, cotejando-se a assinatura aposta no cheque com a existente no termo de audiência, apresenta-se comezinho que ambas foram exaradas pelo autor, caindo por terra sua alegação fática.
Destarte, desincumbiu-se a parte ré de seu ônus probatório, demonstrando de forma minudente que o lançamento do nome do autor no cadastro de inadimplentes está lastreado no inadimplemento de obrigação creditícia representada por cheque emitido por aquele.
Por corolário, não há que se falar em reparação civil, senão vejamos:
"APELAÇÕES CÍVEIS - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO LIMINAR DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA E AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS - DEMANDAS CONEXAS E JULGADAS SIMULTANEAMENTE - IMPROCEDÊNCIA DOS PLEITOS NO JUÍZO DE ORIGEM - TELEFONIA - SUPOSTA COBRANÇA DE VALORES REFERENTES A CHAMADAS NÃO REALIZADAS OU RECEBIDAS - OPERADORA QUE LOGROU ÊXITO EM COMPROVAR QUE A CONSUMIDORA, DE FATO, UTILIZOU OS SERVIÇOS IMPUGNADOS - INSCRIÇÃO DA AUTORA NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO E BLOQUEIO DA LINHA - CONDUTA DA RÉ QUE CONSUBSTANCIA EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO, ANTE O INADIMPLEMENTO DAS FATURAS - RECURSOS DESPROVIDOS.
'A suspensão total dos serviços telefônicos e a inserção do nome de usuário dos serviços de telefonia nos registros do Serviço de Proteção ao Crédito, ambos pela falta de pagamento de fatura, não implicam no direito a reparação de dano moral, pela prestadora do serviço, quando a usuária deixa de adimplir as faturas, qualificando-se a interrupção do serviço e o cadastro da devedora nos órgãos de proteção ao crédito como o exercício regular de direito das concessionárias de telecomunicação.' (AC n. 2008.070520-7, rel. Des. Jaime Ramos, j. 24.9.09)". (TJSC. Apelação Cível nº 2008.012990-2. Relator: Rodrigo Collaço. Data: 21.03.2011)
Para arrematar, insta salientar que o nome do autor já estava negativado por outro credor quando da concretização de igual ato pela empresa ré (ex vi do documento de fl. 13), evento que obsta a existência de danos morais mesmo que a segunda inscrição seja indevida, o que não é caso, conforme visto alhures.
É esse o entendimento remansoso da jurisprudência, tendo o Superior Tribunal de Justiça editado a Súmula 385 para tratar do assunto, in verbis: "Da anotação irregular em cadastro de proteção ao crédito, não cabe indenização por dano moral, quando preexistente legítima inscrição, ressalvado o direito ao cancelamento."
No mais, observa-se que o autor litigou imbuído de má-fé.
O autor menciona na peça exordial que não deu causa ao débito que gerou sua inscrição nos cadastros creditícios e, com esteio em tal alegação, pretendeu livrar-se do pagamento de dívida contraída e a consequente condenação da parte ex adversa ao pagamento de danos morais. Contudo, a ré comprovou a inverdade dessa versão, derruindo-a com base em provas robustas, antes examinadas.
De acordo com o que restou evidenciado, o autor alterou a verdade dos fatos, incorrendo na vedação do art. 17, II, do Código de Processo Civil: "Art. 17. Reputa-se litigante de má-fé aquele que: 1980-1988/L6771.htm[...] II - alterar a verdade dos fatos;"
Por conseguinte, mister se faz a aplicação de multa correspondente a 1% (um por cento) do valor da causa e a condenação ao pagamento as despesas processuais e honorários advocatícios (art. 18 do CPC).
Deixo de fixar valor correspondente à indenização de que trata o art. 18 do CPC, pois não há provas de a ré ter suportado danos em decorrência do processo deflagrado pelo autor.
3 – Dispositivo:
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE (art. 269, I, do CPC) o pedido formulado por Albino Mazzo em face de Auto Posto Madalena II (Irmãos Schoepping Ltda).
CONDENO o autor ao pagamento de multa correspondente a 1% (um por cento) do valor da causa, em razão de sua litigância de má-fé (artigos 17 e 18 do CPC).
Arca a autor com o pagamento das despesas processuais e de honorários advocatícios, estes fixados R$ 500,00 (quinhentos reais), tendo em conta a natureza da demanda, o tempo e a valorização do trabalho do advogado (art. 20, § 4º, do CPC.
Fica a exigibilidade da verba sucumbencial suspensa, na forma do art. 12 da Lei 1.050/60.
P. R. I.
Chapecó (SC), 24 de março de 2011.
Angélica Fassini
Juíza Substituta